Vamos conversar?

Vamos conversar?

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Era uma vez… (Zero outra vez?)


Era uma vez um par de pés que ia sempre com outro par de pés estrada afora. Debaixo da ponte pescar. Nas tias de longe. Na praia longínqua que parecia ser o privilégio guardado como presente, como herança pelo par de pés pai.

Par de pés filha pegou gosto! Foi aprendendo andar com as próprias pernas. Abraçou o presente e se pôs na estrada. Descobriu a linha do horizonte. E descobriu que esta linha é só um risco que atiça e convida a ir além. Porque quando você chega lá, a linha já andou um pouco além. E ela sempre te chama. Você vai, avança e não para de descobrir horizontes mais!

A porta se abre, sim. Não se você ficar esperando a melhor hora. Tudo em torno estar certo e você estar pronto pra ir. A gente vai assim mesmo! Porque é o caminho que prepara a gente pra próxima porta, a próxima parada, a próxima dúvida, a próxima resposta…

A vida pode ser apenas o dia após o outro. Prever-viver.
A vida pode ser um dia mais outro. E mais outro. E outro. E outro. Uma soma constante e ininterrupta! Que enriquece e aquece o coração.

Nesta metade da vida, descobri que o mais importante herdei. A maior riqueza trago comigo! E neste caminho, o necessário se leva nas mãos, pouca bagagem, excesso é bobagem, vive-se com pouco, porque aqui do lado de fora da gente, sorriso é moeda de troca que vale mais do que dinheiro. Com ele, muito ou pouco, as coisas acontecem de alguma forma. Existem sempre dois caminhos. O fácil e o difícil. E inúmeros outros caminhos mais. Que você cria se realmente quiser ir.


Ando reescrevendo minha história! Finalmente, entendi que este ir pra frente não significa fazer cada vez mais. Mas fazer bem feito, viver bem vivido, de coração sincero, dentro do possível para o momento, mesmo que, nariz torto, contrariada, lhe pareça ter retrocedido, voltar a um zero daquela andança toda que já fez!

Zero, meu amigo, não é insignificância! Não é ausência no caminhar. Não é vazio de feitos. Não é ter perdido o que já se ganhou. Zero é ponto de partida! É start! É de onde eu vou. Sempre vou… 

sábado, 16 de dezembro de 2017

Tô de boa


-Tô de boa, eu respondo.
-O que aconteceu?
-Nada. Ou tudo! Como preferir…
-Como assim?
-Coisas aconteceram. Delas, imaginei miliuma outras mais. Algumas vieram no caminho. Outras escaparam. Outras jamais aconteceram. E duasmiliuma, não sei ainda.
-Não entendo. É esta dúvida que te faz ficar assim… De boa???

Desenho a minha melhor cara de felicidade. A cara mais sincera e desprevenida de despreocupação, rasgo um sorriso maroto e chuto:

-As certezas acontecidas são apenas o registro seguro do vivido. É no que tá lá na frente, nebuloso, sem forma que residem as possibilidades infinitas. É duvidoso. Mas eu tenho a chave!

Num esforço de fazer cara de “entendi” vejo um sorriso amarelo, talvez, cinza de falta de cor na vida.

-Nunca pensei deste jeito…
-As portas passadas estão trancadas. As adiante, não! E sou eu que abro as que eu quiser e passo nas que eu quiser. Melhor. Posso abrir, espiar, passar ou partir. Mas as portas não vêm até mim. Sou eu que tenho de seguir no corredor.
-Hummmm…
-Vou dizer que é fácil, não. Há tempos que passo apressada, malemá espio as portas. Vou sempre nas mesmas. As que parecem ter aquilo que já sei. Já sei viver. Já sei fazer. Fico com a impressão de fazer bem demais e cada vez melhor ainda. Fico exibida e feliz.. Mas é puro comodismo. Pra não dizer medo. Aí, perco as outras portas!

Me sinto fitada com uma cara que não se disfarça a sua total incompreensão.

-Há outros tempos que de tão cega, tropeço. Do tropeço, o tombo. Dalguns, me levanto rápido e prossigo. Doutros, a prostração provocada é tão grande que mal me reconheço. Fico esparramada no meio do corredor, de cara pro chão, tentando levantar pelo menos a cabeça pra conseguir enxergar onde foi que parei. O que foi que me fez cair. Pra onde devo seguir.

Quando o curso do piloto automático é interrompido, assim, bruscamente, sem mandar aviso, ou obedecer o nosso prepotente comando, dá uma pane. Ligar o piloto manual é assustador! Porque, anestesiada, já não prestávamos mais atenção no caminho. Nem na porta. Na verdade, a grande verdade é que colecionávamos portas, ao invés de histórias.

Fato.

Precisou eu cair miliuma vezes neste corredor pra compreender…

Tô de boa não é uma fala de desdém. De quem não liga, não ligou e não vai ligar se ver o céu amanhecer roxo, se as pessoas que amei partirem, se o tempo acabar.


Tô de boa é aceitar que o caminho percorrido teve tropeços, sim, choros, sim, intermináveis soluços pelo perdido. Mas incontáveis vezes de recomeço de levantar, mesmo sem saber se ia aguentar. De sequer ter ideia e descobrir, no caminho uma força não sabida pra se manter em pé, em movimento

Tô de boa é poder olhar pra frente sem desespero. De medo de não ter mais tempo de viver um infinito de “ses”. Porque se tem a certeza de ter dito todas as palavras trancadas dos euteamo, meperdoe, quisefiz. E poder se dar ao luxo de ficar de papo pro ar, lavar a louça se quiser,  porque não mata deixar a casa um pouco virada, só pra ficar de rainha, atoaatoa, estátua!

Tô de boa é se esquecer de números de produtos, de vitórias, de coleçõesdefiz!  De zerar as cobranças. A dos outros e aquelas mais cruéis. Daquele apontador de dedo implacável que parecia não descansar nunca. A gente mesmo.

É chegar a um ponto, debaixo de uma boa sombra, não ter mágoa, nem o orgulho besta de ser perfeita. Ter errado, mas não doer mais. De ter tentado, mesmo sem ter entendido os sins, os nãos, os talvez. E acima de perdoar os desencontros e perdoar a mim mesma.

Só assim, a gente deixa de levar pedras do caminho, fazendo peso e pesar o andar… 

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Uma hora acontece!

Você já viu alguma coisa que está na cara que vai acontecer? E que ficar dizendo que não, é o mesmo que por escoras nunca árvore gigante que decidiu que vai cair, sim senhor?
Então...
 

Certas coisas são tão óbvias que você olha, olha, olha e dizer que não vai acontecer é como querer ser cego naquilo que não tem jeito, mesmo. É como enxugar gelo.

A vida é mesmo engraçada! A negação é engraçada, igualmente… Falo de coisas que o tempo traz, o tempo leva, o vento faz de conta que não sabe e quando se vê, já trouxe de volta… A gente resiste, resiste, resiste e, acaba deixando pra lá. Meio que faz de conta que não vê que perdeu a briga. De não deixar acontecer.

Vivo ligada. Andando, conversando, de papo pro ar e atenta no olhar, vou como se fotografando o meu passar. Fotografo conversas. Fotografo frases. Fotografo imagens que me chamam atenção pra escrever. Então, estou lá eu passando pela calçada da árvore caída e não resisto. “Uma hora, cai!” Uma hora, acontece!


É uma imagem óbvia. No muito, colocaria escoras. Todo mundo vê e todo mundo deve pensar o mesmo. Vai cair. Mais dia, menos dia, cai!

Na hora me remeteu à metáfora que ela representa. Certas coisas óbvias de serem, existirem e acontecerem, são disfarçadas, camufladas e escoradas. Podem até segurar por algum tempo o desfecho óbvio. Mas a natureza não pode ser abafada. Nem tampouco, é possível nadar contra a maré. A força natural daquilo que nasce pra ser assim ou assado derruba as escoras que teimam dizer não.

Tô me vendo meio assim. A árvore está envergada… Falta pouco pra encostar no chão. Esta tal da natureza parece entender muito bem do que somos feitos. O que sentimos, o que queremos. Acho que é como dar murro em ponta de faca. Chover no molhado.

E se eu fizer da árvore tombada, um banco? E da história inacabada um conto em tempo real?

Só sei uma coisa. Árvore pode mudar de nome e virar banco, mas será sempre árvore. A história pode por fim e depois, dizer que virou trilogia, saga, seriado e por isso, nunca acaba. Pode dizer o que quiser. Camuflar até o fim. Mas o que tem de acontecer, acontece. Pode demorar o que for. Uma hora acontece… 

domingo, 10 de dezembro de 2017

A praça e suas histórias


Estive, noites destas, na pracinha perto de casa. Já não se fazem mais praças como antigamente… Ou será: já não se fazem mais frequentadores de praça como antigamente?!

Vi uma cena que seria digna de se esfregar os olhos, apertá-los para fixar bem o olhar e ver se era real ou uma miragem. Pai e filho brincando de bicicleta pela praça! Brincando de correr um atrás do outro cortando os caminhos da pracinha. Joia rara. Não se vê mais isso! Pais com filhos em praças brincando. Bicicletas como brinquedo sem maiores pretensões além do prazer de brincar de andar de bicicleta. Praças com vida!


Sou do tempo que praça significava espaço de lazer, de se ir com filhos pra brincar no parquinho que era algo como obrigatório nas praças da cidade. Um espaço cheio de brinquedos de se pendurar e cair naquela areia que podia não ser a mais limpinha pra se por o pé descalço, a mão que fazia montinhos que imitavam comidinha e onde, também, se sentava pra se brincar com o que estivesse a mão, galho, folha, pedrinha, pedrona que faziam parte do repertório infantil que imaginava nestes objetos, panelinha, comidinha, bichos, super heróis!

Praça era o espaço pra reunir crianças que vinham de perto e de longe, brincavam juntas sem fazer cerimônia, que oferecia pouco e tudo! Sombras de árvores que se despejavam sobre o gramado que convidavam para picnics improvisados, bancos que viviam cheios de gente que não economizavam horinhas de boa prosa naquela camaradagem típica de um tempo onde todo mundo conhecia todo mundo. E quando não conhecia, acabava conhecendo!

As praças foram se esvaziando. Foram se tornando espaços abandonados, descuidados e nada atraentes ou seguros. Ficaram vazias de crianças. De vizinhança. E os pais deixaram de buscar espaços para levarem seus filhos pra brincar lá fora!

Houve, também, uma substituição de personagens. Adultos saem de casa agora com seus cãezinhos, enquanto as crianças ficam dentro de casa, distraídas por brinquedos eletrônicos. Vejo praças com adultos e cachorros e não vejo crianças brincando. Aí, nestes raros momentos em que vejo crianças perambulando nas praças, fico feliz da vida de ver que há pais ainda que brincam com seus filhos.

O mais legal do que vi foi justamente a bicicleta na praça. Há tanta norma proibindo isso e aquilo que não seria difícil alguém passar por ali, olhar e achar ruim. De estarem, pai e filho, andando de bicicleta na praça. Como se fosse melhor proibir… A cara marota, tanto de um como de outro, denunciava a cumplicidade alegre entre eles. Quer tesouro melhor a se guardar do que colecionar momentos assim?


E a bicicleta estava no seu exato papel. Brinquedo. Não era uma trilha casca grossa, com altimetria cheia de dígitos, pra fotografar e contar o feito. Era só uma praça. Que tem mais esta história pra guardar e contar. 

domingo, 3 de dezembro de 2017

Performance ou Lazer? Com que cara você corre a corrida da vida?


Para que você pratica atividade física?
A grande maioria vai responder “lazer”.
SQN.

Vou falar minha opinião, pela minha própria experiência e observação do que via e vejo hoje. Sou educadora física. Fui atleta da Ginástica Olímpica. Fui sedentária por anos. Retornei à atividade física por imposição médica. Na obrigação mesmo. Fui tomando gosto. Naquelas doses homeopáticas de endorfina, saudáveis, inofensivas. Adentrei o mundo da corrida sem querer, por acidente. Progredi. Descobri capacidades esquecidas. Desenvolvi estratégias de superação à dor que me possibilitaram e me mantiveram anestesiada por um lado e totalmente ligada por outro. Ao ponto de querer mais, sempre mais do meu corpo, que aprendeu a responder e ir além. Viciei. Fiquei cega e desaprendi o motivo dos meus primeiros passos na atividade física. O prazer! Porque o prazer que vem do lazer é prazer. O prazer que vem da performance é, bem. Os loucos entenderão. É loucura…

É totalmente polêmico mas vou ter o atrevimento de falar sobre isso.

Dou uma pequena volta pelo lago. Pelo aterro. Antes de virar modinha (minha forma rebelde de criticar esta explosão no meio fitness), as pessoas caminhavam, algumas poucas corriam sem tanta fantasia “eu sou runner”. O que era necessário? Vontade, pernas, uma camiseta qualquer, um shorts um tênis confortável. Só.

Não sou contra esta necessidade natural de pertencimento do ser humano, fazer parte de um grupo e estas combinações que foram surgindo de se correr em grupo. Torço o nariz quando a cor da camiseta (leia-se sou de tal assessoria), ser mais importante do que o prazer de correr. De um prestígio desnecessário. Assim como desnecessário é a parafernália de assessórios para mostrar que é corredor. Eu uso também, quando é necessário. Mas se quiser, corro descalça, de shorts jeans no gramado do aterro.

Lembro das aulas de Educação Física. O que eram aqueles educativos do atletismo? Chatos demais para quem não corria de verdade. Hoje, vejo gerações que odiavam estas mesmas aulas de Educação Física,  pagando pra fazer o quê? Educativos. Não são atletas profissionais, nem de ponta em meio aos amadores. E não estou tirando o devido mérito dos resultados destes mesmos educativos para quem os pratica disciplinadamente. Só não entendo o que faz uma pessoa se empenhar tanto por resultados, deixando de lado a sua busca primeira. Aquela que toda criança experimenta quando bota sua máquina de se mexer em movimento. P R A Z E R!

Uma coisa que passei a reparar e se vê muito por aí. Repare as caras de quem corre. Isso mesmo. Tem cara de feliz? Ou tem cara de sofrimento? Não ignoro o cansaço. Isso faz parte para quem está progredindo. Mas… Cara de sofrimento? Para quê mesmo você começou a correr? Então…

Hoje, no aterro, vi uma mulher fazendo treino na areia. Treino de impulsão, saltos realizados repetidamente. Hoje é domingo. Sozinha. Ficou algum tempo ali, exercitou e foi embora. Na hora me veio esta pergunta na cabeça. “Performance ou prazer?” Que posso facilmente substituir prazer por lazer. Porque dá na mesma. Prazer que fica, ou efêmero? Que daqui a pouco já tem de ser substituído por outro e nunca tem fim?

Faço o gancho, então, para quem não é desta tribo. Nem corre, nem pratica esportes. Não precisa ser para entender. Basta pegar outro elemento de prazer. Um carro. Um carro novo. Um carro mais caro. Um carro mais caro, mais equipado. Uma roupa nova. Outra de outra cor. Outra de outro modelo. E outra e outra. Comida. Outro prato. Uma quantidade maior. Mais e mais. Bebida. Outra com outro atrativo diferente. Artesanal. Outro sabor. E outra e outra.

Vão me dizer que estou viajando. Tô não.

O prazer quando é genuíno, não precisa buscar a overdose. Entende? Tudo que é bom e não se sacia, vai por um caminho sem fim. E passa a nunca estar no momento presente. Porque imediatamente se obtendo o resultado esperado, já vive a frustração da falta de se ter algo além pra ser almejar e correr atrás. Faz hoje mas de olho naquilo que está lá longe da sua mão.

Pode substituir. Performance por ambição. E lazer pela alegria instantânea do simples. Aí, qualquer um vai entender do que estou falando.